Intolerância será grande desafio para o Brasil nas eleições, avaliam especialistas

O debate eleitoral não esperou 2022 para começar, mas deve se intensificar à medida em que o ano for passando. Na avaliação de sociólogos ouvidos pelo Portal MaisPB, a polarização faz parte da política, mas, no Brasil, o problema tem sido a intolerância. “O desafio para 2022 será o de realizarmos um processo eleitoral transparente e completamente dentro das regras do jogo, sem subterfúgios, sem ameaças de rupturas institucionais, sem apelos a supostos tutores da democracia do país”, avalia o professor Roberto Véras.

Véras é doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP), professor associado da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e professor permanente no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Campina Grande (Mestrado e Doutorado). Para ele, desde as eleições de 2014, o país foi inserido em um ambiente de instabilidade política e institucional de tal magnitude que o pacto político expresso na Constituição de 1988 vem sendo sistematicamente questionado. “Enquanto o foco na Constituição não for restabelecido pelas forças políticas e as instituições que constituem a democracia brasileira, viveremos um contexto de instabilidade”, acrescenta.

A ameaça às regras democráticas também é uma preocupação do professor emérito da UFPB, Rubens Pinto Lyra, para quem ano novo é uma oportunidade de transformação na política brasileira. “Estamos num momento em que é preciso união e mobilização de todo mundo. Precisamos restaurar a democracia”, destaca. O professor acredita que a eleição será polarizada e sem terceira via. “A terceira via não existe. É algo fantasioso. A alternativa é associação das forças democráticas mais ampla possível e os conservadores liberais que prezam a democracia”.

Rubens Pinto Lyra é doutor em Direito Público e Ciência Política, na área de Política e Estado pela Universidade de Nancy, na França, e foi professor dos cursos de Pós-Graduação em Sociologia e em Direito da UFPB e do Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Potiguar (RN). Crítico ao atual governo, o Lyra é autor do mais recente livro “Bolsonarismo: Ideologia, psicologia e política e temas afins” e não esconde sua insatisfação com a atual gestão. “Só há perdas, da devastação ambiental à atuação no exterior onde Bolsonaro é considerado um pária”, pontua. O sociólogo ainda avalia que o atual presidente já teria perdido parte de seu eleitorado e que “a não ser que haja uma reviravolta, ele não será eleito”. O professor também não acredita em ameaças reais ao processo eleitoral. “Não acredito em golpe, mas acredito que o presidente vai tentar tumultuar ao máximo”, opina.

Sobre as consequências da eleição, Roberto Véras salienta que o momento eleitoral será decisivo para os próximos anos no país. “Podemos dizer que será decisivo o lado para o qual a balança pender: se prevalecer o compromisso das forças à esquerda e à direita com o jogo democrático, com o respeito à Constituição e às instituições que lhe dão existência objetiva, então a democracia sairá fortalecida e ganhará com isso a chance de deixar para traz a crise político-institucional na qual o país se meteu a partir de 2015; se, ao contrário, prevalecer um ambiente de ameaças às regras democraticamente estabelecidas, sejam quais forem os argumentos usados, o clima de instabilidade se estenderá indefinidamente, com desfechos imprevisíveis”.

Crises sanitária e econômica

Para os especialistas, o país tem muito desafios a superar este ano. A pandemia e seus efeitos ainda guardam um espaço considerável nas discussões e podem ajudar a definir os resultados eleitorais. Para o professor Rubens Lyra o Brasil só experimentou perdas nos últimos anos. “O presidente ataca os direitos humanos todos os dias. Nós vivemos uma destruição dos direitos sociais. O país está ruim do ponto de vista econômico, os milhares de mortos da pandemia… É necessário fortalecer as instituições e apoiar as entidades de classe”.

Para Roberto Véras, é importante salientar que a pandemia, ao chegar ao país, já encontrou um quadro de crise econômica, políticas e institucional, desencadeada especialmente a partir de 2015, tendo como momento mais agudo o impeachment de Dilma Rousseff, em 2016, mas se estendendo pelos anos seguintes. “Em 2022, ao que tudo indica, continuaremos convivendo com a pandemia (apesar dos fantásticos efeitos produzidos sobretudo pela vacinação), com a crise econômica e o desemprego, com o agravante de que se trata de um ano eleitoral nos quais normalmente a agenda política tende a centrar-se na agenda eleitoral”, acrescenta.

O professor avalia que a pauta de 2022 será focada nas questões que impactam no dia a dia dos brasileiros. “Penso que as pesquisas têm indicado que a economia, a inflação, saúde, educação, pobreza e fome darão a tônica. Ao contrário da eleição anterior, que foi dominada pelos temas da corrupção, da segurança pública e referidos às comportamentais. A situação econômica da maioria da população brasileira chegou em uma situação tal de dramaticidade que a questão social tem sido alçada ao primeiro plano, embora isso não significa eliminar a importância dos demais temas”.

Ainda segundo Véras, no que se refere aos seus impactos socioeconômicos, o país foi atingido de modo diferencial. “O Brasil foi um dos mais duramente atingidos: além do extraordinário número de contágios e óbitos, do estrangulamento dos serviços de saúde pública, do crescimento do desemprego e da inatividade, da contração do PIB, entre outros problemas, tem apresentado enorme dificuldade de produzir um esforço nacional e consistente de recuperação. Ao contrário disso, a descoordenação das ações dos poderes públicos é notória e de efeitos deletérios desastrosos”, lamenta. Para começar a sanar os problemas em 2022, ao que tudo indica, o país vai precisar superar as diferenças.

MaisPB

COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA

Facebook
Twitter
WhatsApp